Rasā

Ofereça-me abrigo, Maha Lakshmi

Embebeda-me em kundalinī shakti,

toca-me como uma pétala

enquanto vibramos na mesma frequência.


Ofereça-me morada, Maha Lakshmi,

permite-me decifrar os enigmas

em suas orbes celestes,

em sua pele encravejada com notas de Allah.


Ó Kāma, formas de Tripura Sundarī, Shodashi,

digna-me com o mais puro esplendor.

Que o calor de kundalinī serpenteie o meu Eu,

que me lambuze com o néctar do nunca-dito.


Estive, por mais de uma vez, com Mahalakshmi,

e como no Pentateuco, o suspiro divino

derramou-me a essência no cetim

enquanto entoava ordens celestiais

e nossa derme emaranhava-se como uma só.


“Rasā” é um poema-invocação que transita entre erotismo e mística. Evocando Maha Lakshmi, Tripura Sundarī e a energia kundalinī, o eu-lírico busca a fusão do corpo e da alma na frequência do sagrado. Essa experiência é descrita em termos tácteis e sensoriais — pele, pétala, néctar, cetim — mas não se limita ao erótico: é também o encontro com o “nunca-dito”, aquilo que escapa à linguagem.

Psicologicamente, o poema dramatiza a união entre pulsão erótica e pulsão de transcendência. Em Freud, é o Eros em sua forma mais elevada; em Lacan, é o encontro com o Real, o impossível de ser dito mas plenamente sentido. Em Jung, Maha Lakshmi surge como arquétipo do feminino divino, guia interior do sujeito em direção à totalidade.

Literariamente, “Rasā” inscreve-se na tradição mística que une corpo e espírito, de San Juan de la Cruz a Rumi, de Kabir a Octavio Paz. Ao fundir referências hindus, islâmicas e bíblicas, o poema realiza um sincretismo singular, afirmando que todo amor humano pode ser metáfora de uma busca maior: a comunhão com o mistério.