Levar-me-ás para a chapada esmeraldina?
Levar-me-ás para teus segredos?
À revelação dos véus de Ísis,
às cartas de todos os mahatmas?
Levar-me-ás às entranhas da ilusão,
ao caminho que me debruça na escuridão?
Pegarás em minha mão e protegerás os meus?
No planalto esmeraldino,
na boca do mundo,
na caldeira de Hefesto,
adormecida pelo grito de Prometeu?
Prometes-me que guiarás minha usura?
Prometes-me que celebrarás minha saúde?
Grande Arquiteto, estarás com a lupa
quando a noite cegar meus olhos?
E quando estiver cansado, deito na beira do rio.
E quando eu estiver mais triste —
mais triste de não ter jeito —
rogo por ti, ó nunca-dito,
para que eu possa prosperar. Saravá!
“Rumo à boca do mundo” é um poema de invocação e entrega. O eu-lírico roga por condução espiritual, ora em registros míticos (Ísis, Prometeu, Hefesto), ora esotéricos (mahatmas, Grande Arquiteto), ora populares (Saravá). Essa convergência cria uma espécie de sincretismo poético, onde o sagrado universal e o sagrado brasileiro se encontram.
Psicologicamente, o texto encena o desejo de proteção diante da incerteza. Freud explicaria como projeção paterna: a súplica ao Grande Arquiteto que guia e protege. Em Lacan, a promessa nunca é plenamente cumprida — o “nunca-dito” é o lugar vazio do Outro, impossível de preencher.
Literariamente, o poema dialoga com tradições épicas e místicas, mas encerra-se no tom humano e cotidiano: o cansaço à beira do rio, a tristeza sem jeito, o pedido de prosperidade. O “Saravá” final sela a oração em registro brasileiro, revelando que o transcendente só faz sentido quando enraizado na experiência concreta.
Assim, “Rumo à boca do mundo” é uma oração-poema em trânsito entre o esotérico e o existencial, o cósmico e o íntimo, a esperança de revelação e a aceitação da própria condição humana.