Escravos de njó


Cara de gato,

menino mandu, moringa em bilha, marimbondo com pus.

Cara de gato, menina caçula, capenga e coxa, cachaça pra tu

Cara de gato, menino, meu dengo, cochila, dormita, bunda, rabo e mandengo

Cara de gato, menina mandu, dengo e mimo, trasorelho e caxumba, Jesus!

Cara de gato, menino caçula, carimbo, sinete, lenga-lenga que seduz?

Cara de gato, menina dengo, xingar, insultar, lenga-lenga na cruz!

Cara de gato, menino mandu, Quem te pariu,

que de assuma e que te dê caruru.

que te dê caruru!


Baseado na obra: Castro, Yeda Pessoa. Camões com dendê: O português do Brasil e os falares afro-brasileiros (Portuguese Edition) (p. 166). Edição do Kindle. 



1. Folclore e Cultura Popular

A expressão "cara de gato" pode remeter a expressões populares e folclóricas, evocando uma linguagem coloquial que se refere a características físicas ou comportamentais. O uso de termos como "menino mandu" e "menina caçula" sugere uma conexão com a cultura popular brasileira, onde expressões e personagens típicos são comuns.

2. Referências à Infância e à Simplicidade

O poema exalta a simplicidade e a inocência da infância. A repetição do formato "cara de gato" pode ser uma alusão à maneira como crianças são descritas carinhosamente. Essa relação remete a poetas como Cecília Meireles, que frequentemente exploram a infância e suas nuances em obras como Romanceiro da Inconfidência.

3. Literatura de Cordel

A estrutura rítmica e repetitiva do poema lembra a literatura de cordel, uma tradição popular nordestina, que utiliza rimas e ritmos para contar histórias e expressar sentimentos. A referência a elementos como "cachaça" e "caruru" reforça essa conexão, visto que esses temas são comuns nas narrativas de cordel, como nas obras de Patativa do Assaré.

4. Referências Religiosas

O uso de "Jesus!" no verso pode ser interpretado como uma invocação, que traz um tom de leveza e humor, ao mesmo tempo que insere uma dimensão religiosa que ecoa a presença de figuras sagradas em diversos poemas da literatura brasileira. Essa invocação lembra a obra de Adélia Prado, que frequentemente mistura o cotidiano com o espiritual.

5. Regionalismo e Linguagem Dialetal

A linguagem coloquial e regional, com expressões como "trasorelho" e "cachaça pra tu", sugere uma intertextualidade com o regionalismo da literatura brasileira, que busca capturar a essência do falar popular. Isso pode ser associado a autores como João Guimarães Rosa e Graciliano Ramos, que exploraram as particularidades da linguagem regional e suas nuances.